Você sabe como é feito um tatame?

Normalmente em português escrevemos tatame, mas a pronúncia correta é tatami. Este termo deriva do verbo tatamu, que significa dobrar ou empilhar, muito provavelmente porque no início, os tatames eram um piso que caso não estivesse em uso poderia ser dobrado ou empilhado.

Originalmente os tatames eram um item de luxo exclusivo da nobreza. Com o passar do tempo, gradualmente tornou-se acessível e comum em todas as casas no período Muromachi, principalmente também pela popularização da Cerimônia do Chá.

Existem regras de etiqueta para o uso de tatames. Desde a forma como são dispostos na sala até a forma de andar sobre eles. Por exemplo, não é educado pisar calçado sobre eles. Andar pisando nas bordas entre um e outro também pode soar grosseiro.

Um tatame tradicional é feito de basicamente três componentes: o material da superfície denominado tatami-omote; o núcleo denominado tatami-doko e uma borda de acabamento denominada, tatami-beri. A esteira da superfície é tecida com folhas de uma espécie de junco chamada igusa, uma planta usada na confecção de textêis no japão há pelo menos dois mil anos.

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Uma linda plantação de Igusa.

O núcleo é feito comumente de palha de arroz compactada, pois esta oferece um perfeito grau de firmeza e também é muito durável.

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Por último, a borda, feita de seda, linho ou algodão, além de dar o toque de requinte à peça, serve para prender o núcleo à superfície de esteira.

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Agora que você sabe do quê os tatames são feitos, veja um vídeo bem legal de como eles são feitos:

Na época em que Jigoro Kano treinava, os tatames eram exatamente assim. Hoje em dia, um tatame desses custa uma pequena fortuna por aqui, tornando absurdamente custoso manter um dojô de um tamanho razoável. Além da difícil manutenção, tem também o fato de que a palha da esteira dava algumas queimaduras se friccionada contra a pele. Ralar a cara na palha lutando não devia ser um negócio legal…

Aqui no Brasil, quem é das antigas no judô, deve se lembrar de tatames confeccionados também com núcleo de palha de arroz, mas recobertos com tecido, no lugar da esteira de igusa. Competi algumas vezes quando a FPJ ainda tinha alguns tatames desses… Nossa, cara, era triste cair neles! Parecia concreto! Faz muito tempo que não vejo mais desses, mas segundo os mais experientes, os tatames oficiais eram assim por aqui desde a década de 60.

Os tatames oficiais de hoje são um compensado de espuma, recobertos com uma lona que imita a textura da igusa do tatame tradicional. Algo parecido com isto, numa visão recortada:

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Já nos dojôs locais, era comum até não muito tempo atrás, o tatame todo ser uma grande área cujo núcleo era feito com raspas de pneu e coberto com uma lona. Aprendi judô num tatame desses. Era gostoso de cair, mas em alguns lugares as raspas de pneu ficavam mais socadas, e aí também ficava complicado. Ainda existem muitos dojôs de raspa de pneu com certeza, mas a grande sacada agora é o tal do E.V.A.

O Etil Vinil Acetato é uma resina termoplástica derivada do petróleo. O baixo custo de produção desta borracha a torna muito útil para diversas aplicações, inclusive para a fabricação de tatames. Os tatames de E.V.A. recomendados para prática de judô têm no mínimo 30mm de espessura para melhor absorção de impacto e costumam já ter os encaixes tipo “quebra-cabeças” pra facilitar a montagem. Embora este material seja relativamente barato e prático, infelizmente não possui uma vida útil muito longa se não for muito bem cuidado. Se for montado e desmontado todo treino, com certeza não vai durar muito. Eu particularmente acho que os tatames de E.V.A. (pelo menos todos que treinei até hoje) não possuem uma rigidez adequada pra que as quedas do judô sejam executadas da melhor forma. Eles têm muito rebote, isso é, você “quica” muito quando cai. Outra coisa que me incomoda, é que eles também não oferecem um deslize fluido para o tsuri ashi, o passo arrastado do judoca. Se você pratica katás num tatame desses deve saber do que estou falando ;)

Apesar de tudo, se tem uma coisa que posso falar com toda convicção sobre qualquer tipo de tatame é que, sem eles, praticar judô seria no mínimo, muito mais doloroso! :P

E você, qual sua experiência com tatames? Chegou a treinar naqueles de palha também? Gosta mais dos oficiais ou acha melhor estes de E.V.A.? Deixe seu comentário!

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As vezes tudo o que a gente precisa é de uma pausa

“A vida necessita de pausas.”

Carlos Drummond de Andrade

Teve uma época que eu precisei parar meu judô. Não foi exatamente falta de motivação, mas confesso que por um certo tempo fiquei bem desanimado e desapontado com meu desempenho no esporte. Vou compartilhar com vocês essa história de uma forma bem resumida:

Comecei a aprender judô já um pouco tarde da adolescência, lá com meus 14 para 15 anos, e como todo bom sonhador (que mal tem?), acreditava em seguir uma carreira competitiva, conquistando títulos paulistas, brasileiros, mundiais.

Infelizmente fiquei longe disso.

Sei que eu não lutava mal, mas, os caras que ganhavam, aqueles que estavam no topo (entre eles na minha categoria, Felipe Kitadai, antes da Seleção), eles sim treinavam pra isso. Nem fico me lamentando, afinal eu mais sonhava do que treinava.

Enfim, chegou então a hora de trabalhar. Aliás, desde os 15 já fazia alguma coisa pra poder pagar minhas despesas do judô porque minha mãe sozinha não podia.. Mas agora eu precisava mesmo de um emprego fixo, e os horários determinados me impediam de treinar. Aposentei meu judogui por longos 3 anos.

Logo quando foi dando aquelas primeiras saudades do treino, eu realmente me perguntava… O que eu faria no judô se já estava tão desanimado e não me interessava competir?

Quando me dava muita saudade, eu via vídeos, daqueles de “melhores ippons”, mas com o tempo comecei a ver conteúdos não só de lutas e técnicas, mas também sobre história do judô, do jujutsu, seus valores e filosofias. Conheci os katás e me interessei muito por eles também. A saudade só aumentava e aumentava, até que finalmente consegui uma brecha na agenda pra treinar.

A primeira vez de volta ao tatame é como pisar nas nuvens. Os primeiros rolamentos, quedas e golpes saem meio quadrados, mas a sensação é maravilhosa. Enfim voltei ao treino vendo o judô de forma totalmente diferente. Pude adaptar minhas metas e criar novas. Com a mente aberta aprendi muito mais tanto teoricamente quanto tecnicamente também.

Talvez você esteja lendo e se identificando com algumas partes dessa história. Muita gente que por algum motivo não consegue seguir a carreira como atleta, é chamado pela vida para os estudos, para o trabalho, para a família ou para outra coisa. Quase sempre isso pede uma pausa da prática do esporte. Mas acredite, se o judô já entrou de vez na sua vida, mesmo parado, você não estará fora dele!

Longe de mim dizer aqui que você então deve seguir o mesmo caminho que eu, mudando toda sua concepção de treino, ou parar de pensar em shiais para treinar apenas katás. O ponto exato onde quero chegar é que, as vezes a pausa, mesmo contra nossa vontade, é a solução pra muitos problemas. Talvez essa pausa seja a coisa mais importante a se fazer pra recobrar as energias, amadurecer as ideias e ver as coisas como são do lado de fora.

O que o mestre Jigoro Kano fez ao alterar o sufixo jutsu(arte) para dô(caminho) parece algo simples e com pouco sentido, mas na realidade teve um impacto muito forte. Veja que arte refere-se à atividade do artista, e no caso específico do artista marcial remete ao movimento e ação diretamente ligados a prática desta arte. Enquanto isso, o Caminho, é uma via que transcende os limites da ação, da estética e do método. Ele pode ser trilhado de infinitas maneiras, até mesmo, quando você pensa estar fora dele.

Portanto, se a vida lhe pedir  uma pausa – caso ainda não o tenha feito – lembre-se que há muitas maneiras de continuar no Caminho. Talvez você possa se especializar estudando arbitragem e até arbitrar em competições eventualmente, talvez sua profissão possa ter algo pra ajudar- como um programador que desenvolveu um app de judô para celular ou um fisioterapeuta que desenvolveu melhores práticas de tratar lesões comuns do esporte – enfim, as possibilidades limitam-se à sua criatividade. Oportunidades são muitas, pra você ver… dá até pra tentar contribuir escrevendo um blog. ;)

Perigo! Quando a exigência esportiva dos pais prejudica o resultado dos filhos

O pilar mais forte da estrutura de desenvolvimento de uma criança em qualquer esporte não é o professor ou o método, mas sim a influência que esta criança recebe em casa, dos pais e da família de um modo geral. Por melhor que seja o professor, é quase impossível manter motivada uma criança que entra numa atmosfera negativa assim que sai de um treino ou de uma competição.

Um dos problemas mais comuns que tenho observado, é o de pais que muitas vezes são muito ansiosos pelos resultados esportivos de seus filhos. Mais até do que os próprios filhos. Não conseguem segurar a frustração de verem-nos derrotados em uma competição, ou estão sempre de olho no desempenho dos treinos, muitas vezes atuando de fora do tatame como um “segundo técnico”. Este tipo de pai está sempre acompanhando a criança e geralmente até aprende todas as regras do esporte. Não que isso seja ruim, isso é ótimo, mas com limites. E o limite é justamente quando isso se torna uma pressão adicional sobre o aluno.

Nem sempre se trata de um sonho frustrado do pai. As vezes é apenas a vontade de ver o filho bem sucedido no esporte, um campeão… talvez um futuro atleta olímpico. Quem não deseja o melhor para os filhos não é mesmo? Acontece que a pior forma de conseguir um resultado desses é com pressão desnecessária. O pior mesmo é que as vezes esta pressão começa muito cedo.

Hoje em dia temos competições de judô da categoria mirim e infantil, onde competem crianças de 5 a 10 anos. Várias vezes em que arbitrei nestas competições fiquei muito triste ao ver pais na beirada do tatame esbravejando, desrespeitando os árbitros e brigando com filhos que perderam. Isso é no mínimo, ridículo. Uma péssima influência e uma pressão psicológica insuportável para uma criança dessa idade. Se isso gera algum resultado, são os piores possíveis. Aumento da ansiedade nas próximas competições, desmotivação no treino e até perda de interesse pelo esporte são os reflexos mais comuns. Mas, em casos mais específicos, por exemplo, para crianças que competem regularmente no alto nível, a exigência de rendimento dos pais pode resultar em quadros depressivos.

Como professores, é importante sabermos o momento de intervir quando pais e familiares apresentam este comportamento com os filhos. Precisamos saber o momento pois nem sempre a primeira vez que um pai pressiona o filho é um sinal de que ele sempre impõe uma exigência de resultado. Percebo que muitos destes pais não compreendem o real significado do judô e o quanto ele vai além da competição para beneficiar a criança de um modo geral. Um dia desses uma avó de um aluno (vejam que nem sempre são os pais diretamente) me abordou no fim do treino e disse, na frente do próprio: “Nossa, o Fulaninho é muito mole lutando né, ele já treina faz tantos meses, porque será que ele não luta melhor?”. Na hora, vem aquela vontade de dar uma bronca na avó. Mas isso com certeza traria um atrito desnecessário se a “bronca” fosse mal interpretada. Precisamos perceber que do lado de quem é leigo, o pensamento é mais ou menos o seguinte: “O judô é uma luta, meu filho não está conseguindo lutar, então meu filho não se deu bem com o judô.” Neste caso a avó não percebeu que o Fulaninho era um menino muito tímido quando entrou no judô, mas hoje, depois de alguns meses, já está muito mais extrovertido, interage e se diverte muito mais, mas na hora do randori, ainda continua um pouco tímido. É só uma questão de tempo para que ele evolua neste aspecto também.

Por outro lado se o pai tem uma tendência de pressionar de forma mais agressiva ou frequente, é bom ter uma conversa com ele, a sós, longe da criança e explicar de uma forma moderada como isso atrapalha o próprio desenvolvimento desta no esporte. Diga a este pai que a competição é uma parte pequena do judô e mostre com argumentos como seu filho já teve tais e tais evoluções em outras áreas. Claro que nenhum professor quer ter essa conversa, mas se for necessário, tenha. Não deixe passar e virar algo que traga problemas maiores depois.

A melhor forma de não ter esta conversa é sempre deixar claro para os pais e alunos, durante os treinos ou fora deles, quais são os principais valores do esporte. Sempre tenha conversas aos fins de treino com as crianças para que os pais de fora ouçam e aprendam sobre tudo isso.

Se você é pai de um judoquinha e está lendo este post, gostaria de deixar algumas dicas sobre como se comportar a respeito:

  • Jamais crie climas de rivalidade
  • Não aconselhe o técnico sobre como dar aulas ou como treinar seu filho
  • Se o técnico orientou seu filho sobre como lutar em tal competição, não “passe por cima” orientando de outra forma
  • Jamais faça comentários depreciativos contra técnicos, árbitros ou outros atletas na frente da criança
  • Permaneça na área de espectadores durante a competição
  • Tome cuidado com críticas e comportamentos negativos quando a criança perder uma competição ou tiver um mau desempenho

É preciso entender muito bem este último para por em prática. Não quer dizer que você deva sempre premiar a criança quando ela perder, dizer que está tudo bem, porque no fundo ela sabe que não está. Aliás é bom permitir que ela sinta e assimile a derrota por um tempo, mas sozinha. Ela não precisa que você também sinta o mesmo mal. O que é essencial neste último tópico é que, depois de um mau desempenho, é importante estar ali presente pra qualquer coisa, oferecer o ombro, dar uma palavra de apoio e incentivo e ver o desenrolar da coisa. Procurar ser sempre o mais positivo nessa hora, e tomar cuidado para que a linguagem corporal não diga o contrário do que você está querendo dizer. A melhor forma de ter este comportamento é entender de verdade o quanto o judô é completo para a formação do seu filho. Assim você vai ver que o incentivo vale muito mais que a sua cobrança e que mesmo que ele não consiga ser um campeão olímpico, trilhando este caminho, ele será um campeão na vida.

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